segunda-feira, 13 de outubro de 2008

A minha primeira doente

Vesti a farda (oferecida com tanto carinho pela minha avó) e pensei: “Nem acredito que já cheguei até aqui”… Senti-me ansiosa e, como é natural, com receio do desconhecido.
Reportando-me ao meu primeiro dia de Estágio hospitalar, lembro-me essencialmente de me sentir completamente perdida e de ter ficado responsável por uma senhora idosa, de poucas conversas, que raramente convivia com outros utentes internados ou com os técnicos de saúde. Após várias tentativas de diálogo com a senhora, o resultado era o mesmo: a senhora não falava, não correspondia.
Um dia lembrei-me de lhe perguntar se queria ir até à janela para me mostrar o que conhecia de "P" já que eu pouco ou nada conhecia. Ela disse que também não conhecia muito bem a cidade (não vivia em "P") e então resolvi dizer-lhe eu o que sabia. A partir daí, a senhora pedia-me todos os dias para ir até à janela. Na altura, encarei a situação de forma até um pouco egocêntrica: “consegui que a senhora falasse!”. Mais tarde, pude perceber que não fui propriamente eu, mas sim o tempo que disponibilizei a falar com ela, a atenção e o carinho que lhe dei.

Com a experiência, tornamo-nos mais humildes – na minha opinião, condição essencial para se ser um bom profissional de qualquer área e para se saber trabalhar em equipa, na medida em que toda a verdadeira ajuda começa na humildade. A meu ver, só conseguimos ajudar se adoptarmos uma atitude humilde para com a pessoa que pretendemos ajudar. A ajuda não pode ser dominadora, mas sim um serviço.

A relação de ajuda é algo extraordinário, mas delicado. Compreendi também que, por vezes, a senhora não falou porque preferiu ouvir. Aprendi que devemos respeitar o silêncio das pessoas e, em determinadas situações, nós próprios fazermos silêncio. Saber ouvir, ou melhor, escutar as pessoas é um grande passo para a relação de ajuda.

4 comentários:

Unknown disse...

Parabéns pelo teu blog...Agora vou ter mais um sabor diário que é vir ver se escreveste mais alguma coisa.

Boa sorte para esta tua nova janela para o mundo!

beijinhos

pseudo adulto disse...

As pessoas que se sentem doentes precisam de ouvir mas também precisam de falar.

As pessoas que se sentem doentes precisam de atenção e de uma palavra de conforto. Precisam de saber que o seu estado é passageiro.

As pessoas que se sentem doentes não querem que passem por elas nos quartos como se fossem bonecos.

As pessoas que se sentem doentes precisam que os enfermeiros os tratem com dignidade e respeito.

Gostei muito da tua forma de escrever, em especial dos dois últimos parágrafos.
Às vezes, o silêncio faz milagres e muitas vezes basta saber que alguém está ao nosso lado, para nos sentirmos melhor! Parabéns pela escolha desta profissão. Ser enfermeiro é das profissões, se não a profissão, mais digna que existe.

Anónimo disse...

Ola! Estou a gostar do blog, espero que haja continuação!
De facto também aprendi muita coisa na nossa profissão, e muitas das pessoas (os chamados doentes) ensinam-nos tanta tanta coisa e fazem-nos crescer tanto enquanto ser humano. Pelo menos eu vejo dessa prespectiva. Têm a vivencia deles, a sua personalidade e o seu modo de vivenciar o estado em que estão... a maioria das vezes um estado de maior "carência" e sensibilidade ou mesmo de defesa, e tu, como enfermeiro, estás la, a cuidar deles e a absorver todas estas diferentes experiencias!

Joana disse...

Hoje vim aqui parar, sem contar... É bom poder passar aqui e ir lendo o que escreves, aprender um bocadinho e trazer-te para mais perto ;)

Nem acredito que já chegaste aqui! Em muitos sentidos! ;)

Beijinho grande